O Senado
aprovou por unanimidade, nesta terça-feira (25), a proposta de Emenda à
Constituição (PEC) que altera regras e torna permanente o Fundeb –
fundo que financia a educação básica.
O texto foi aprovado com o mesmo teor já aprovado na Câmara dos Deputados, no
mês passado. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), deve promulgar a
emenda já nesta quarta (26) em uma sessão do Congresso marcada
para as 11h.
A PEC prevê, entre outros pontos, a ampliação
gradual da participação da União no Fundeb, de forma a chegar a 23% a partir de
2026. Atualmente, essa complementação financeira do governo federal está em
10%. O placar no Senado foi de 79 votos a 0, nos dois turnos.
'Protagonismo'
Apesar do consenso dos líderes partidários a favor
da proposta, o tema ocupou todo o tempo da sessão plenária nesta terça. Os
senadores quiseram discursar para defender o Fundeb e registrar o
"protagonismo" do Congresso na construção do texto.
“Esta é uma sessão histórica. É um novo momento da
educação brasileira e – é muito bom a gente lembrar – protagonizado pelo
Congresso Nacional. O Congresso foi fundamental, puxou o debate para que hoje
nós tivéssemos um novo Fundeb e a sua ampliação”, disse a líder do Cidadania,
Eliziane Gama (MA).
Líder do
governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), afirmou que o Executivo e sua
base no Congresso vão “agilizar a regulamentação” do novo Fundeb.
“Para que tudo esteja pronto, para que a partir do próximo ano, com a
chegada dos novos prefeitos, que serão eleitos em 15 de novembro, nós possamos
inaugurar um novo tempo da educação brasileira”, disse o emedebista.
Humberto Costa (PT-PE) fez críticas à atuação do governo Jair Bolsonaro
durante as discussões da PEC.
“Esse governo que aí está passou um ano e meio sem se preocupar com o
Fundeb, tentou pegar uma carona no final. Mas, felizmente, como isso aqui é uma
emenda constitucional, Bolsonaro, você não vai poder vetar. Nós vamos promulgar
e o seu governo vai ter que cumprir. Você não vai pegar carona nem vai vetar
essa grande conquista do povo”, declarou o petista.
Após a sessão, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), disse
que a aprovação da PEC deve ser reconhecida como uma “conquista do Parlamento”.
“Sem dúvida nenhuma, isso precisa ser reconhecido pela sociedade, que
foi, sim, uma conquista do Parlamento, porque essa matéria tramitou no
Congresso brasileiro, e será promulgada, por ser uma emenda constitucional, pelo
Congresso brasileiro”, declarou.
O Fundeb
Considerado
essencial para o ensino público no país, o Fundo de Desenvolvimento da Educação
Básica pode deixar de existir em dezembro se não for prorrogado. A extinção é
definida na própria lei de criação do fundo.
A renovação é tida como fundamental para garantir o reforço de caixa de
estados e municípios para investimentos da educação infantil ao ensino médio.
O fundo é composto por contribuições dos estados, Distrito Federal e
municípios e por uma complementação da União sobre esses valores. Hoje, o
Fundeb representa 63% do investimento público em educação básica.
Em 2019, os recursos do Fundeb chegaram a R$ 166,6 bilhões. A
participação federal é usada para complementar os fundos estaduais que
reuniram, em determinado ano, um valor por aluno abaixo do mínimo nacional.
No ano passado, nove
estados precisaram receber essa complementação:
Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco e Piauí.
Segundo o
relator no Senado, Flávio Arns (Rede-PR), o Fundeb garante um investimento
mínimo de R$ 3,6 mil ao ano, por aluno, em todo o país.
“Não fosse o Fundeb, estima-se que os valores mínimos de aplicação em
educação girariam em torno de R$ 500 por aluno por ano, nos municípios mais
pobres do Brasil”, diz.
"Trata-se, portanto, de um dos principais
instrumentos de redistribuição de recursos do País, realocando valores no
âmbito de cada estado, entre o governo estadual e as prefeituras, para tornar o
sistema educacional mais equitativo e menos desigual", acrescentou Arns.
Participação da União
Atualmente, a União complementa o Fundeb com 10%
adicionais sobre o valor total arrecadado por estados e municípios. A PEC prevê
uma escala de crescimento:
·
2021: 12%
·
2022: 15%
·
2023: 17%
·
2024: 19%
·
2025: 21%
·
2026 em diante: 23%
Desses 13 pontos percentuais adicionais, a partir
de 2026, 5,25 pontos vão para a educação infantil – serão investimentos na
infraestrutura, para melhorar as creches que existem e construir novas.
O governo federal pretendia incluir, nesse ponto,
recursos para "alugar" vagas em creches particulares. A Câmara chegou
a colocar no texto a previsão de recursos para creches privadas sem fins
lucrativos, como as filantrópicas.
Esse trecho, no entanto, foi retirado durante a
análise no Senado. O relator, Flávio Arns, diz que esse tipo de repasse já está
na Constituição e, por isso, não havia por que ser repetido. A mudança não faz
com que o texto volte à análise dos deputados.
Salários
A PEC estabelece que pelo menos 70% do
Fundeb seja usado para o pagamento de salários de profissionais da educação.
Hoje, o percentual é mais baixo (60%), mas se refere apenas aos salários de
professores.
A proposta proíbe o uso dos recursos do Fundeb para
pagamento de aposentadorias e pensões, e faz o mesmo com o salário-educação –
outra fonte de recursos para a educação básica, cobrada como uma contribuição
social sobre os salários pagos pelas empresas.
Distribuição 'híbrida'
No modelo atual, o Fundeb é distribuído com base
nos dados dos 26 estados e do Distrito Federal. O dinheiro é repassado a fundos
estaduais para, só então, ser distribuído às prefeituras por critérios
internos.
O novo texto prevê um modelo híbrido, que também
leva em conta a situação de cada município para os cálculos e os repasses. A
ideia é corrigir distorções do modelo vigente, que levam cidades
ricas em estados pobres a receberem reforço – e cidades vulneráveis de estados
ricos a ficarem sem complementação.
A distribuição dos 23% de complementação da União
no fundo, após seis anos, será dividida em três. Ficará assim:
·
10 pontos percentuais seguirão as regras atuais de distribuição, para os
estados mais pobres que recebem o complemento da União para atingirem o padrão
mínimo de valor anual por aluno;
·
10,5 pontos percentuais serão distribuídos para redes públicas de
ensino municipal, estadual ou distrital que não atingirem o valor anual total
por aluno (VAAT), parâmetro de distribuição criado com base na capacidade de
financiamento das redes de ensino, sendo que metade do montante deve ser
destinado à educação infantil. É nesse montante que haverá uma trava para
investimentos de 15%;
·
2,5 pontos percentuais serão distribuídos com base na evolução dos
indicadores de atendimento e melhoria da aprendizagem com redução das
desigualdades. Esse percentual será implementado, gradativamente, a partir do
terceiro ano de vigência do texto.
Custo-aluno
A PEC também inclui um artigo na Constituição para
dizer que o padrão mínimo de qualidade do ensino, a ser garantido pela União
com repasses financeiros aos governos, deve ter como referência o custo-aluno
qualidade (CAQ).
·
Veja perguntas e respostas sobre esse indicador
O CAQ é um parâmetro de financiamento educacional
previsto no Plano Nacional de Educação (PNE) que define qual deve ser o
investimento por aluno para garantir a qualidade na educação.
O PNE foi aprovado em 2014 mas, passados seis dos
dez anos previstos para o cumprimento das metas, o Ministério da Educação e o
Conselho Nacional de Educação (CNE) ainda não estabeleceram a fórmula de
cálculo ou o valor do CAQ.
Outros pontos
Hoje, a Constituição reparte entre os municípios os
impostos arrecadados pelos estados. Um exemplo é a distribuição do Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), em que 25% dos valores
apurados vão para os municípios.
A PEC altera esse artigo. Segundo o texto, desse dinheiro destinado às
cidades, 65% será dividido de acordo com a arrecadação e 35% conforme lei
estadual, que ainda será criada pelos Legislativos locais.
A proposta deixa claro que pelo menos 10% da arrecadação do tributo
será distribuída entre os municípios "com base em indicadores de melhoria
nos resultados de aprendizagem e de aumento da equidade, considerado o nível
socioeconômico dos educandos".
A PEC prevê, como forma de controle e transparência, a obrigatoriedade
de disponibilização de informações e dados contábeis, orçamentários e fiscais
por todos os entes federados, os quais deverão ser divulgados em meio
eletrônico e de amplo acesso ao público.
Segundo o texto, também deve ser garantida a participação da sociedade
nos processos de formulação, monitoramento e avaliação de políticas sociais na
educação.
O que defendia o governo
A renovação do Fundeb estava em discussão com o
governo há mais de um ano e meio. Às vésperas da votação do texto na Câmara, o
Executivo se mobilizou para segurar a análise e negociar mudanças na proposta.
O governo defendia, por exemplo, a inclusão de um trecho para destinar
20% dos recursos repassados pela União ao fundo à transferência direta de renda
para famílias com crianças em idade escolar.
A intenção era que os recursos viessem a compor o Renda Brasil,
programa em estudo que deve substituir o Bolsa Família. Entretanto, após
repercussão negativa da proposta, não houve acordo e a destinação dos recursos
para essa finalidade ficou de fora da PEC.
O governo também tentou retirar trecho do texto que diz que os recursos
do Fundeb não poderão ser utilizados para o pagamento de aposentadorias e
pensões, mas mais uma vez foi derrotado.
Alguns governistas tentaram evitar que a proposta entrasse em vigor a
partir de 2021, mas não conseguiram. A previsão foi mantida no texto.
Articulando com a base aliada, o governo conseguiu diminuir os
percentuais de complementação federal em 2021.
A relatora na Câmara, Dorinha Seabra (DEM-TO), queria aumentar a
participação do governo de 10 para 12,5% no próximo ano. Com acordo com o
Planalto, o incremento, em 2021, será de 10% para 12%.
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