Não é preciso ser especialista na
política brasileira para perceber que a aplicação da lei Magnitsky contra o
ministro do STF Alexandre de Moraes é uma "violação grosseira",
avalia o ex-investidor britânico William Browder.
O britânico fez campanha global
pela criação dessa lei e hoje se dedica integralmente à defesa dela nos EUA e
em outros países. Ao UOL, ele disse que se Moraes acionar a Justiça dos Estados
Unidos para derrubar as sanções impostas pelo governo de Donald Trump, o
ministro vence.
'Não há nenhum outro caso como o
de Moraes'
Browder disse que o uso da
Magnitsky contra Moraes foi feito por "motivos políticos óbvios". Na
última quarta-feira, o governo dos Estados Unidos incluiu o nome do ministro na
lista de sancionados com base nesse mecanismo, que permite que as autoridades
confisquem quaisquer bens que Moraes tenha em solo norte-americano e o
congelamento de contas bancárias vinculadas a instituições dos EUA.
“O uso da lei Magnitsky pela
administração de Trump é uma violação grosseira. Está sendo feita por motivos
políticos óbvios, não há nenhuma alegação que eu saiba de que o ministro esteja
envolvido em tortura ou corrupção em grande escala. Pelo que li, parece muito
claro que Donald Trump e outros estão bravos com ele [Moraes] por ele estar
processando o ex-presidente brasileiro [Jair Bolsonaro, réu por tentativa de
golpe de Estado].
Essa lei não foi feita para
resolver disputas políticas. Foi feita para ajudar as vítimas de grandes
violações de direitos humanos. [...] Não vi nenhum outro caso em que a lei foi
mal utilizada assim.
Sou especialista é na Lei
Magnitsky. Não sou especialista no Brasil ou nesse juiz em particular. E o que
posso dizer é que não é preciso ser especialista, as alegações que adversários
[de Moraes] fizeram contra ele não estão no nível de sanção pela Lei Magnitsky.
Se você pegar a acusação mais séria, a de que ele derrubou [contas do] Twitter,
de que não acredita em liberdade de expressão... essas coisas não são
sancionáveis pela Lei Magnitsky.”
'Moraes venceria disputa na
Justiça dos EUA'
Browder disse que uma das maiores
preocupações ao conceber a lei Magnitsky era garantir que houvesse uma maneira
de reverter inclusões indevidas —e que este caso pode se tornar a primeira vez
em que isso acontece.
“A lei permite uma revisão
jurídica. Até o momento, ninguém nunca contestou as sanções porque eram casos
claros de violações. Neste caso, acredito haver uma chance real para que Moraes
faça um apelo à Justiça, dizendo que esse é um uso errado da lei.
O governo Trump está usando mal
esta e várias outras leis, e tem perdido recursos na Justiça em 96% dos casos.
Eles estão realmente se comportando como cowboys em relação à lei.
Se tiver um caso em que a
contestação da lei Magnitsky fará sentido, este [de Moraes] é um deles. Se ele
for à Justiça, acho que ele vencerá.”
Criação da lei foi para honrar
advogado
Browder foi um dos maiores
investidores estrangeiros na Rússia, antes de ser processado pelo governo de
Vladimir Putin. A lei leva o nome do advogado dele no caso, Sergei Magnitsky,
que descobriu e denunciou um esquema de corrupção, em que autoridades russas
desviaram US$ 230 milhões pagos em impostos pela empresa de Browder.
Magnitsky foi para uma prisão
russa, onde morreu pouco menos de um ano depois, em 2009. O Kremlin alega que
foi por insuficiência cardíaca, mas entidades de direitos humanos apontam que
ele foi espancado até a morte.
Eu fiz um voto à memória dele
[Magnitsky], à família dele e a mim mesmo de que haveria justiça. E isso não
era possível na Rússia, onde o governo estava completamente envolvido no crime
e em sua ocultação. Quando eu fui pesquisar como poderia conseguir justiça fora
da Rússia, vi que não havia nenhum mecanismo legal.
E se não havia, então eu teria de
criar um. Pensei em como eu poderia acabar com a impunidade para torturadores e
assassinos como os que mataram Sergei, e tive a ideia de congelar seus bens e
banir suas viagens, que levei ao Congresso americano. [...] Foi isso que se
tornou a lei global Magnitsky, aprovada em 2012 e ampliada em 2016.
Eu fiz um voto à memória dele
[Magnitsky], à família dele e a mim mesmo de que haveria justiça. E isso não
era possível na Rússia, onde o governo estava completamente envolvido no crime
e em sua ocultação. Quando eu fui pesquisar como poderia conseguir justiça fora
da Rússia, vi que não havia nenhum mecanismo legal.
E se não havia, então eu teria de
criar um. Pensei em como eu poderia acabar com a impunidade para torturadores e
assassinos como os que mataram Sergei, e tive a ideia de congelar seus bens e
banir suas viagens, que levei ao Congresso americano. [...] Foi isso que se
tornou a lei global Magnitsky, aprovada em 2012 e ampliada em 2016.
Desde que a lei foi aprovada,
várias pessoas muito ruins foram colocadas na lista, como os envolvidos no
genocídio Rohingya, em Mianmar; os policiais que mataram manifestantes
pacíficos na Nicarágua. [...] A lei dá esperança às vítimas desamparadas de violações
de direitos humanos ao redor do mundo.
Tenho medo de que, com o mau uso
da lei Magnitsky, ela perca a credibilidade e pessoas envolvidas em genocídio
ou assassinatos pensem que ela foi feita só para resolver disputas políticas -e
não foi.
Uol.
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