O senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) mentiu aos
senadores em plenário sobre as suas relações com o bicheiro Carlinhos
Cachoeira. Mentir em plenário configura quebra de decoro parlamentar.
Essa será a base do relatório preliminar do senador Humberto Costa
(PT-PE) no Conselho de Ética. Com base nisso, Humberto pedirá a cassação
do mandato de Demóstenes. Além de mentir, o senador goiano também
auferiu bens indevidos na sua relação com Cachoeira, o que também
configura quebra de decoro.
Quando saíram as primeiras
informações do envolvimento de Demóstenes com Cachoeira, publicadas pela
revista Época, o senador goiano foi à tribuna do Senado para dar as
suas explicações. Na ocasião, a revista informou que a Polícia Federal
gravara mais de 200 horas de conversas de Demóstenes com Cachoeira, o
que indicava uma relação estreita entre os dois. Na tribuna, Demóstenes
reconheceu ter “amizade” com Cachoeira, mas disse que suas conversas com
ele tratavam de questões “triviais”. Segundo ele disse na ocasião, o
volume de conversas deveu-se a uma questão pessoal: a mulher de
Cachoeira, Andressa, largara o suplente de Demóstenes, o empresário
Wilder de Morais, para ficar com o bicheiro. Na tribuna, o senador
garantiu que atuara como uma espécie de conselheiro sentimental no caso.
Ele também deu explicações sobre o fato de ter ganho uma cozinha
completa, importada, de presente de casamento de Cachoeira. E afirmou
que não sabia dos negócios ilícitos de Cachoeira.
No relatório
preliminar, que começará a ler a partir das 10h de hoje no Conselho de
Ética, Humberto observará que Demóstenes caiu em contradição várias
vezes quanto às suas relações com Cachoeira, à medida em que foram
surgindo novas informações. Há contradições, inclusive, entre o que ele
disse inicialmente e o que apresentou na sua defesa por escrito.
Discurso e atitudes
O
relatório de Humberto explora também contradições entre o discurso
moralizador de Demóstenes, declarando-se contrário à exploração do jogo,
e suas atitudes como senador. Uma parte do texto concentra-se em
mostrar como o senador goiano agiu, como parlamentar, para atender a
interesses do bicheiro no Congresso Nacional.
Fazendo a relação
entre as atitudes de Demóstenes e os presentes de casamento que ganhou
do bicheiro, Humberto Costa mostrará que se tratam de bens auferidos de
forma ilícita, o que também fere o decoro parlamentar e mesmo o Código
de Ética do servidor público. Pela gravidade das imputações, o relator
pedirá como pena a cassação do mandato.
Nada de grampos
O
relatório de Humberto tomará o cuidado de não citar nenhum dos grampos
vazados pela imprensa que detalham as relações entre Demóstenes e
Cachoeira. O inquérito da Operação Vegas, da Polícia Federal, que
investigou o bicheiro, só chegou oficialmente à CPI ontem (2). E ainda
não houve mesmo qualquer decisão de compartilhamento dessas informações
com o Conselho de Ética (que não detém as atribuições das CPIs para
lidar com dados sigilosos). Assim, Humberto não tinha como obter
oficialmente os dados contidos nas gravações e demais investigações da
PF. Para não correr o risco de ver seu relatório invalidado, ele
preferiu deixar os grampos de lado.
Como há uma autorização do
ministro Ricardo Lewandowski, do STF, para que os dados do inquérito
possam ser compartilhados com o Conselho de Ética do Senado e com a
comissão de sindicância da Câmara que investiga os deputados envolvidos
com Cachoeira, é possível que Humberto venha a se valer das
investigações da PF quando preparar seu relatório final sobre o caso.
O
relatório preliminar é apenas o passo inicial do processo de cassação.
Hoje (3), será feita apenas a leitura do relatório, e pode, no máximo,
haver um início de discussão sobre seu conteúdo. Se quiser, Demóstenes
pode fazer alguma consideração. Na próxima terça-feira (8) é que o
relatório de Humberto será votado. Aprovado o relatório, começarão a ser
ouvidas testemunhas, que Demóstenes pode arrolar em sua defesa, e
outros senadores podem pedir também (já há pedidos do senador Randolfe
Rodrigues, do Psol do Amapá, e Humberto deverá pedir testemunhas
também). Ouvidas as testemunhas, Demóstenes apresenta a sua defesa
final, e Humberto seu relatório final. O relatório é votado no Conselho
de Ética em votação aberta e precisa ter a maioria de votos para ser
aprovado. Aprovado no Conselho de Ética, é encaminhado ao plenário, que é
quem tem o poder de cassar ou não Demóstenes, em votação secreta.
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