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11 de fevereiro de 2015

Empreiteiras combinavam licitações desde o governo FHC, diz delator

O executivo Augusto Mendonça Neto, da Setal, em depoimento à Justiça (Foto: Reprodução/Justiça Federal do Paraná)
O executivo Augusto Mendonça Neto, da Setal,
em depoimento à Justiça
(Foto: Reprodução/Justiça Federal do Paraná)

Augusto Mendonça Neto prestou depoimento à Justiça nesta segunda.
Ele também disse que o 'clube' passou a ter 'efetividade' com Costa e Duque.

Lucas Salomão*Do G1, em Brasília


O executivo Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, dono da Setal Engenharia e um dos delatores do esquema de corrupção na Petrobras, afirmou em depoimento à Justiça Federal do Paraná nesta segunda-feira (9) que o "clube" das empreiteiras passou a combinar resultados de licitações desde meados da década de 1990, época em que o país era presidido por Fernando Henrique Cardoso.
Segundo Mendonça Neto, as empresas e aPetrobras instituíram um grupo de trabalho para discutir e melhorar as condições contratuais. O grupo funciona até hoje, explicou o empresário. Ele disse que, a partir dessa aproximação, um grupo de nove empreiteiras passou a combinar com qual delas cada obra ficaria. A combinação não tinha o conhecimento da estatal, segundo Mendonça Neto.
G1 entrou em contato com o Instituto FHC mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
Ele disse ainda que o cartel passou a ter efetividade a partir de 2004, quando as empresas passaram a negociar contratos com os ex-diretores da estatal Paulo Roberto Costa e Renato Duque. A partir daí, segundo o executivo, houve cobrança de propina para que as empresas obtivessem contratos.
"As empresas, com o intuito de se protegerem, fizeram um acordo entre si de não competirem entre elas mesmas. Naquela ocasião eram nove companhias e tinham o compromisso de não competir. Cada uma escolhia uma determinada obra por uma visão de mercado futuro e quando chegasse a vez daquela companhia, as outras companhias se comprometiam a submeter preços superiores", afirmou em depoimento.
Para o empresário, naquela época, a combinação tinha resultado "muito relativo" já que, segundo ele, o número de companhias que prestavam serviços para a Petrobras era bem maior do que as nove empresas integrantes do "clube".
“Isso [o acerto entre as empreiteiras] passou a ter efetividade, de fato, a partir do ano de 2004, quando este grupo negociou com a diretoria da Petrobras, com os dois diretores, Paulo Roberto [Costa] e Renato Duque, de modo que a lista de convidados fosse restrita às empresas que participassem desse grupo. A partir daí, durante um período, o resultado dessas reuniões, dessas escolhas, passou a ser mais efetivo”, explicou Mendonça Neto.
O executivo explicou ainda que o pagamento de propina para a obtenção de contratos foi negociado com o ex-deputado já falecido José Janene (PP) na diretoria comandada por Costa, e com Duque e o ex-gerente Pedro Barusco, na diretoria de Serviços.
Mendonça Neto afirmou à Justiça que, após a entrada de Costa e Duque nas negociações, as reuniões do grupo de empreiteiras passaram a ser mensais. Ele disse ainda que, a partir de 2006, outras sete empresas passaram a integrar o cartel.
Ele também disse em seu depoimento que, a partir do fim de 2011 e começo de 2012, a atuação do clube foi perdendo eficácia.
“[As reuniões] foram interrompidos porque perderam completamente a eficácia. Ainda na gestão do Paulo e do Duque foram perdendo eficácia com inclusão de novas companhias propositadamente pelo lado da Petrobrás", explicou.
"E também a partir da saída deles, que aconteceu no começo de 2012, essa interlocução com a companhia acabou, a partir daí essas reuniões se tornaram absolutamente ineficazes e deixaram de acontecer, não houve mais nenhuma tentativa de acordo a partir dessa época”, relatou o executivo.
Conta para propina
Outro executivo a prestar depoimento nesta segunda, Júlio Camargo, da Toyo, afirmou que auxiliou o ex-diretor da Petrobras Renato Duque a abrir uma conta no exterior para recebimento de propina.

Camargo disse em seu depoimento que os pagamentos de vantagens eram feitos sempre em nomes de offshores e nunca em nomes de funcionários da Petrobras.
“Era sempre em nome de offshores, cujo beneficiário eu não sabia quem era. Identifiquei uma conta só, do sr. Renato Duque, porque eu auxiliei na abertura da conta no mesmo banco onde eu tinha conta. Houve uma transferência da minha conta para a conta dele”, explicou o executivo, que também firmou acordo de delação premiada com o Ministério Público.
Questionado sobre a quantia paga aos diretores e funcionários da Petrobras durante o tempo em que participou do esquema, Júlio Camargo afirmou que, em 2006, pagou "mais ou menos" R$ 7,5 milhões para a diretoria comandada por Renato Duque e R$ 7,5 milhões para a diretoria de Paulo Roberto Costa.
"Para a parte de Abastecimento [dirigida por Costa], sempre meu contato para liquidação era o senhor Alberto Yousseff e dali, juntos, em conjunto, nós organizávamos um cronograma de pagamento para contemplar a área. E na parte de Engenharia [e Serviços, dirigida por Duque], eu me relacionava, na parte de liquidação, para determinar o cronograma e como fazê-lo, com o senhor Pedro Barusco", completou Camargo.
'Regra do jogo'
Júlio Camargo também afirmou ao juiz federal Sérgio Moro, responsável pela Lava Jato na primeira instância, que o pagamento de propina para a obtenção de contratos era algo comum e fazia parte da "regra do jogo".

Questionado sobre se outras empresas pagavam propina aos diretores da Petrobras, Camargo disse acreditar que sim. O juiz também perguntou ao executivo se esse pagamento era encarado com "naturalidade" dentro das empresas.
“Era a regra do jogo, eu acredito que pagavam. Eram coisas que a gente não comentava um com o outro porque evidentemente era segredo de cada empresa”, explicou.
"Se eu quisesse ter sucesso, e a minha atividade era obter sucesso aos meus clientes, era obrigatório o pagamento das propinas", concluiu o executivo.
Em seu depoimento, Augusto Mendonça Neto disse acreditar que em todos os principais contratos da Petrobras, entre 2005 e 2009, houve pagamento de propina.
"Numa determinada época, talvez entre o final do ano de 2005 até o ano de 2008 ou 2009, acredito que foram os principais contratos da Petrobras, isso aconteceu", disse.
Operadores do esquema
Na última quinta-feira (5), quando foi deflagrada a nona fase da Lava Jato, os procuradores doMinistério Público Federal informaram, em entrevista coletiva, que 11 pessoas atuavam como operadores do esquema que desviava dinheiro da Petrobras.

O papel deles, segundo o MPF, era fazer a propina paga pelas empresas chegar até diretores da Petrobras e agentes públicos. De acordo com os procuradores, a atuação dos 11 investigados era similar ao do doleiro Alberto Youssef, apontado como chefe do esquema
Na lista do Ministério Público Federal estão:
- Zwi Skornicki
- Milton Pascowitchi
- Shinko Nakandakari
- Mario Frederico Mendonça Goes
- Atan de Azevedo Barbosa
- Cesar Roberto Santos de Oliveira
- Guilherme Esteves de Jesus
- Bernardo Schiller Freigurghaus
- Luis Eduardo Campos Barbosa da Silva
- João Vaccari Neto
- Augusto Amorim Costa

Mário Goes teve a prisão preventiva decretada na quinta. Ele se apresentou a PF no último domingo (8). O nome de Goes apareceu na delação premiada do ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco.
* Colaboraram Tadeu Nunes, Kleyson Barbosa e Clara Velasco, do G1, em São Paulo.
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VALE ESTE - Arte Lava Jato 7ª fase (Foto: Infográfico elaborado em 15 de novembro de 2014)

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