Na mesma semana em que um meteoro assustou o mundo, em São Paulo caíram quase dois mil raios em um único dia. Há dez anos não se via uma tempestade elétrica tão violenta na cidade.
Em nenhum lugar do planeta cai tanto raio como no Brasil. São mais de
cem mortes por ano. Por isso, o Fantástico pede a sua atenção para a
série feita em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais.
Um guia repleto de curiosidades, dicas e histórias incríveis de sobrevivência. Vai começar a viagem pelo "país dos raios"!
Tem gente tão fascinada por descargas elétricas que fabrica raios por
conta própria, com um equipamento chamado bobina de tesla. “Comecei a
fazer com 14 anos, em 2009”, diz o estudante de Engenharia Eletrônica
Grégory Gusberti.
Ele explica como funciona: “Ela acumula energia aos poucos, na parte
metálica superior, até um ponto que a energia escapa, formando uma
faísca”.
“O Grégory é meio autodidata. Ele se instruiu, estudou para chegar no
ponto onde hoje ele desenvolveu essa estrutura bastante potente”, diz o
professor e físico Giovane Mello. Ele explica que uma gaiola blinda a
pessoa que está dentro para que ela não sofra nenhum choque elétrico.
“Ela fica protegida”, garante.
“Mesmo sabendo que, teoricamente, essa gaiola vai evitar que eu seja
eletrocutado, tenho que admitir que ficar aqui dentro é uma sensação
eletrizante! Afinal de contas, não é todo dia que a gente fica bem na
reta de uma faísca de mais de 700 mil volts”, conta o repórter Ernesto
Paglia.
A simulação que não chega nem perto da intensidade, da força e do tamanho dos raios produzidos por uma tempestade de verdade
Na natureza, as descargas elétricas riscam vários quilômetros no céu até
atingir o solo, com uma potência de 100 milhões de volts. Comparando
com as tomadas que temos em casa, é uma voltagem praticamente um milhão
de vezes maior.
Já a intensidade da corrente de um raio é, em média, de 30 mil ampéres.
Para se ter uma ideia, essa corrente é mil vezes mais intensa do que a
de um chuveiro elétrico.
É uma força devastadora.
No dia 16 de janeiro deste ano, um incêndio em uma usina de etanol no interior de Goiás durou mais de nove horas. Um raio atingiu um tanque com 17 milhões de litros de combustível no município de Caçu. No mesmo dia, outro raio abriu um buraco na parede do quarto onde um bebê dormia no berço, em Brasília.
Em 27 de dezembro do ano passado, dois homens morreram atingidos por um raio enquanto jogavam futebol em Tangará da Serra, no Mato Grosso.
Um casal de turistas morreu durante o temporal do dia 6 de janeiro, em Bertioga. Foram as primeiras mortes por raio em 2013 no estado.
Notícias como essas são tristemente comuns. Os raios matam, em média, 130 pessoas por ano no Brasil. Outras 200 ficam feridas. Estamos no auge da temporada: o período entre outubro e março é crítico.
O Brasil é o país que tem a maior concentração de raios de todo o mundo.
São cerca de 50 milhões por ano e a explicação é geográfica. Nós somos o
maior país da chamada zona tropical do planeta, essa região central,
onde o clima é mais quente e, portanto, mais favorável à formação de
tempestades. E onde há tempestades, há raio. Mas como se proteger deles?
Como prever onde eles vão cair?
Em Cachoeira Paulista,
no prédio do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o tupã
da era tecnológica pode ter a resposta. Tupã é o nome do supercomputador
capaz de prever com mais precisão onde vão acontecer as tempestades.
“A previsão até hoje no Brasil era feita numa escala de 20 quilômetros.
Ou seja, um quadradinho de 20 por 20 quilômetros era a resolução que nós
tínhamos. Hoje, com esse novo supercomputador, esse quadradinho de 20
por 20 vai passar a ser de 5 por 5 quilômetros”, diz o maior
especialista em raios do país, Osmar Pinto Junior.
Ele vai viajar com o Fantástico de norte a sul do país para mostrar o que há de mais avançado no monitoramento de tempestades.
“Nós já instalamos 60 sensores no Brasil e estamos instalando mais uns
40. Vai ser a segunda maior rede do mundo. Estamos investindo muito na
geração de alertas confiáveis, com a máxima antecipação possível”,
explica Osmar. Alertas assim são enviados, por exemplo, ao canteiro de
obras da Arena Corinthians.
Com uma supercâmera lenta, é possível enxergar os raios em detalhes. Veja no vídeo.
Com a ajuda de satélites e de sensores no solo, o Inpe consegue
identificar o "quadradinho" de cinco por cinco quilômetros onde há maior
incidência de raios, hoje, no Brasil. Ele fica na região amazônica, uma
área onde o calor e a umidade favorecem a formação de tempestades.
A chance de você repetir oito vezes seguidas, o mesmo resultado, num
dado, é quase impossível, mas essa é a probabilidade, ou o risco, de
alguém ser atingido, em média, por um raio, no território brasileiro.
Mas, se for na Amazônia, a coisa muda. No trecho que existe entre a
cidade de Coari e Manaus, a capital do estado do Amazonas, a probabilidade de alguém ser atingido por um raio é a mesma coisa que você tirar três vezes o mesmo resultado no dado.
É difícil, mas não é impossível. “Eu perdi a minha cunhada, que estava
grávida, faltando duas semanas pra ganhar o bebê”, diz Edilaine.
Com o dado não tem problema, mas dados estatísticos fazem a gente se preocupar. Raio é coisa séria.
“Manaus é
a cidade do Brasil onde mais pessoas morreram atingidas por raios na
última década. São 16 pessoas só na cidade de Manaus”, aponta Osmar.
Segundo o Inpe, 80% das mortes por raio no Brasil poderiam ser evitadas. Basta as pessoas saberem como devem se proteger.
“Eu tampo os espelhos, porque diz que os espelhos puxam o raio”, diz uma mulher.
“A gente não pode ficar em campo aberto”, conta uma menina.
“Acho que o medo deve ser tão grande que a cabeça acaba não racionando e
pensando como a gente deve realmente agir”, acredita outra mulher.
Para tirar as dúvidas, o Inpe preparou uma cartilha de proteção contra
raios, que o Fantástico começa a mostrar neste domingo (17).
O primeiro mandamento é não ficar em lugares abertos, como praias ou beira de rio, durante uma tempestade.
Em outubro de 2011, quando o tempo fechou na prainha do rio Tarumã, em
Manaus, as filhas de Raimundo Alves da Silva procuraram abrigo em um
quiosque. “Começou a chover muito forte. Aí deu o primeiro raio,
escureceu o céu todo. Aí no segundo raio ninguém lembra mais de nada”,
conta Andreza.
Ela, a irmã e três amigos que estavam embaixo do quiosque desmaiaram ao receberem a descarga elétrica que veio pelo chão.
“Às vezes eu me emociono porque você vê as suas filhas desmaiadas,
assim, e sente aquele momento que você ta perdendo duas filhas”, diz seu
Raimundo, emocionado. Eles contam que elas ficaram cinco minutos
desmaiadas.
Quando um raio atinge o solo, a corrente elétrica se espalha até cerca
de 50 metros em volta do ponto de contato. Isso significa que, quem
estiver descalço, como Andreza e a irmã estavam, pode ser atingido por
essa corrente indireta que vem pelo chão.
Na água, o raio se propaga a uma distância ainda maior. Por isso, é
muito perigoso ficar no mar ou em uma piscina durante uma tempestade.
“Eu aprendi que em temporais a gente não pode ficar embaixo só de uma casinha, a gente tem que se proteger mais”, diz Andreza.
Quiosque, guarda-sol, barraca de praia, marquise ou ponto de ônibus,
nada disso serve. Para ser eficiente, o abrigo tem que ser totalmente
fechado. “O que deveria ser feito em uma situação como essa é ir para os
automóveis. A maioria das pessoas vem para cá de carro e o carro é um
lugar totalmente seguro”, aponta Osmar.
Mas tem que ser dentro do veículo, com as portas e janelas fechadas.
Raimundo e Nilzimar não estavam na praia, mas usaram o carro como abrigo
quando uma tempestade caiu sobre o sítio onde moram nos arredores de
Manaus.
“A tempestade era muito pesada mesmo e, quando começou a cair os
primeiros pingos de chuva, aí caiu o primeiro raio. Deve ter caído um ou
dois raios na imediação aqui, mas o primeiro caiu exatamente no
transformador, no poste da energia, derrubando o fio de alta tensão no
chão”, relembra o marceneiro Raimundo Bezerra.
Ele conta quando foi para o carro: “Quando eu vim tentar desligar o
disjuntor na outra casa, eu já percebi que estava dando choque no chão,
eu corri peguei minha esposa e coloquei ela no carro e fiquei dentro”.
O carro é seguro porque funciona como isolante elétrico. A corrente se
distribui pela estrutura metálica sem atingir quem está dentro.
É o mesmo princípio da máquina de raios mostrada no início da
reportagem. Na física, esse efeito é conhecido como ‘gaiola de Faraday’
Na próxima tempestade, a gente já sabe: o melhor é ficar dentro de um
carro ou de outro veículo fechado, como um ônibus, por exemplo.
Fonte G1
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